Carreira: é preciso que a mulher estabeleça prioridades

Mulher Real – A mulher ainda briga muito internamente por conta das várias atribuições que tem. Esse conflito pode levar a uma insatisfação “crônica”? Se sim, isso pode prejudicar no seu crescimento na carreira? Seria essa situação uma desvantagem da mulher em relação ao colega de trabalho do sexo masculino, que concorre com ela à ascensão profissional?

Gisela Monteiro – A mulher atual vive numa tentativa de dar conta de suas diferentes atribuições e papeis sociais. Acho impossível dar conta de tudo com excelência: filhos, vida social, trabalho, relação a dois, diversão, etc… Em determinado momento alguns desses aspectos têm que ser priorizados em detrimento de outros. Por exemplo: filhos pequenos demandam cuidados diferentes de adolescentes. Exigir perfeição, além de ser impossível, pode gerar essa insatisfação crônica a qual você se refere. A tarefa é, portanto, elencar prioridades, não dando a todas as demandas o mesmo peso. A consequência (de não estabelecer prioridades) pode ser tanto o prejuízo na carreira como em outro aspecto da vida.

Considero que a mulher ainda sofre sim esse tipo desvantagem. Embora eu observe que cada vez mais os companheiros “dividem” as tarefas e responsabilidades e não apenas “ajudam” suas mulheres, ainda estamos muito aquém de uma situação de igualdade.

Mulher Real – As exigências para a mulher são maiores do que para os homens?

Gisela Vasconcellos Monteiro – Ainda são. Há coisas que não podem ser feitas pelo homem, como a gestação, o parto e a amamentação. Todo o processo de dar a vida a uma pessoa modifica muito, tanto o corpo como a situação psicossocial da mulher. Exige-se da mulher que a esse processo sejam acrescentadas todas as outras demandas da vida sem nenhum comprometimento no desempenho, o que é impossível, repito!

Mulher Real – Pesquisas realizadas nos Estados Unidos recentemente demonstram que as mulheres que usam maquiagem e que investem no vestuário têm salários mais altos. A pesquisa também mostra que, mesmo as que ganham mais, ainda ganham menos que os homens na mesma função. Como você avalia esses resultados?

Gisela Vasconcellos Monteiro – Pela minha observação, (as pesquisas) refletem uma realidade social muito parecida com a nossa. Cada vez mais temos ampliado as referências estéticas, como tatuagens, piercings, roupas menos convencionais, casual Friday, mas ainda falta um caminho longo para que os modelos mais normatizados desapareçam. A sociedade está sempre em movimento e temos visto uma contestação forte de referências únicas. O ambiente corporativo tende a ser mais resistente a mudanças, mas mesmo ele tem sido afetado. Ancorar o desempenho profissional à roupa que se veste é uma tradição que vem sendo cada vez mais contestada. Ainda bem!

Mulher Real – O que a mulher deve fazer para consolidar a carreira?

Gisela Vasconcellos Monteiro – Uma carreira consolidada depende, além de um profissional reconhecido em sua capacidade, um ambiente econômico e político estável, no qual seja possível tanto o planejamento da empresa como da trajetória profissional de seus empregados (detesto a palavra colaborador!). Não concordo em nada com linhas teóricas que colocam o funcionário como único responsável pelo seu sucesso profissional. Ao profissional cabe, de forma genérica, estar atualizado em sua área de atividade, estabelecer metas junto com a empresa, realizar bem o trabalho para o qual foi contratado, relacionar-se em equipe, ter uma visão de mundo etc, etc. Infelizmente, no ambiente social, político e econômico em que vivemos no Brasil, isso não garante minimamente um emprego, quanto mais a consolidação de uma carreira!

Mulher Real – Já que manter o orçamento doméstico e qualidade de vida da família também são responsabilidades da mulher, quais são as orientações para que isso não se torne um peso e não tire a sua alegria no cumprimento dessa tarefa e das demais?

Gisela Vasconcellos Monteiro – Sugiro que a mulher não aceite esses papeis com naturalmente seu, que divida as responsabilidades e os afazeres com o companheiro. Digo isso porque essa é uma questão que trabalho muito no consultório, com minhas pacientes. Além de uma convenção social, é extremamente confortável ao homem ter quem cuide da família. É um trabalho exaustivo e repetitivo. Ele não é mais um filho, é um adulto igualmente investido das responsabilidades com os filhos.

Outro caminho concomitante é o de priorizar as tarefas e eleger quais as mais importantes e urgentes, conforme respondi anteriormente (na primeira questão).

Mulher Real – Existem dicas que possam ajudar a mulher a decolar na carreira?

Gisela Vasconcellos Monteiro – Gostaria muitíssimo de ter essa resposta na ponta da língua. Decolar na carreira depende de inúmeras variáveis, sejam elas do ambiente do país, da empresa e mesmo da área profissional. Conheço muitos profissionais extremamente competentes que não decolaram, e outros tantos que considero medíocres e saíram do chão. É claro que é preciso muita dedicação, esforço e competência, mas é preciso também acertar o momento e o lugar de correr riscos, de inventar, e eventualmente acertar na mosca. A questão como conseguir o sucesso profissional vem sendo muito discutida. Até agora o que se sabe é que, além da qualidade, há fatores imponderáveis como o acaso ou a sorte, dando um tempero de imprevisibilidade à vida.

Perguntamos à psicóloga o que a mulher deve fazer para ajudar a sorte, e sua resposta foi bastante contundente:

Sobre a graduação: Graduação já não é suficiente, ter pós graduação é que passa a ser um diferencial.

Pra carreira docente, é preciso que seja acadêmico, mas a maioria das áreas aceitam o mestrado profissional muito bem, assim como as especializações.

EAD: Há excelentes cursos à distância também, em instituições de ensino reconhecidas. (para fazê-los) é preciso ter disciplina, mas é uma estratégia de desenvolvimento profissional cada vez mais usada e aceita por boas empresas.

Sobre diferencial: O domínio de um segundo idioma é um diferencial valorizado. O inglês é atualmente a língua utilizada em eventos e para comunicação corporativa internacional.

Sobre comportamentos e rações: As habilidades sócio emocionais têm sido agora foco de inúmeros cursos superiores, para preparar o profissional para lidar com o mundo com valores e referências mais fluidas, dinâmicas. Essas habilidades estão ligadas ao trabalho transdisciplinar, às lideranças contingenciais, à capacidade de mediação, por exemplo.

Mas dentro destas sugestões mais genéricas, é desejável que a profissional conheça as especificidades de sua área de trabalho e verifique o que tem sido exigido pelo mercado.

A psicóloga atende em consultório na cidade de Santos (SP), faz palestras em escolas e empresas e tem uma página no Facebook chamada Falatório com Gisela e agora está no Instagram com o mesmo nome. Através desses canais dá dicas e sugestões por vídeos.